segunda-feira, 4 de novembro de 2019

REFORMA SINDICAL NO BRASIL

O Governo brasileiro anuncia que promoverá a Reforma Trabalhista. Ao  que tudo indica, os estudos serão concluídos ainda neste ano (2019) e o Projeto de Emenda à Constituição será promovido no Congresso Nacional no início de 2020.
Ainda não se sabe ao certo o teor das conclusões a que chegará o Grupo de Trabalho constituído pelo Governo. Mas já se tem alardeado que dois pontos constituirão a PEC:
  1. será instituída a pluralidade sindical, em substituição à atual unicidade, prevista no art. 8º-II, CF;
  2. o imposto sindical ou contribuição sindical compulsória, revogado pela Lei nº 13.467/2017, não retornará. 

Não obstante as demais mudanças que virão, estas são bastantes para alterar profundamente o modelo sindical brasileiro, com reflexos no sistema de representação, na representatividade e nas negociações coletivas de trabalho.
Enquanto hoje os sindicatos brasileiros se organizam por categoria - conceito, aliás, perdido pelo extinto Ministério do Trabalho e Emprego, ao permitir subcategorias e uma enorme pulverização sindical - , no pluralismo é possível a organização por vários outros critérios, ao gosto dos trabalhadores (e dos empregadores), como sindicatos por empresas, por estabelecimentos, por setores econômicos, por categoria etc. Hoje, no Brasil, temos, basicamente: (a) acordos coletivos, celebrados a nível de empresa(s); e (c) convenções coletivas, em nível de categoria.
Nos países em que se adota a pluralidade, há legislação que estabelece quais serão os sindicatos autorizados a representarem os trabalhadores e empregadores em grande e em pequena escala, a depender do número de filiados, ou seja, conforme a sua representatividade. De fato, somente os sindicatos representativos é que podem celebrar, por exemplo, convenções coletivas, ao passo que os sindicatos menores têm sua atribuição negocial restrita a pequenos acordos coletivos.
Outro lado a considerar é que o modelo de pluralidade acarreta a representação dos sindicatos apenas aos seus associados e, portanto, ações judiciais e negociações coletivas não alcançam os não filiados. Considerando que, no Brasil, a média de filiação é de 16% dos trabalhadores subordinados (formais), pelo menos 84% ficarão sem nenhuma representação e, assim, podem ser alvos fáceis para o estímulo à criação de novas entidades promovido pelas empresas, mesmo que isso constitua atividade antissindical.
Há de se considerar, também, que alteração tão profunda na Constituição Federal merece vir acompanhada imediatamente de uma lei própria que normatize o novo modelo e, destarte, estabeleça os critérios de aferição de representatividade, regras para celebração de instrumentos coletivos de trabalho, extensão das cláusulas coletivas etc.
Por fim, cabe observar que é preciso reinventar o financiamento sindical. Se não haverá contribuição compulsória, deve-se estimular a prática do custeio por filiados e não filiados. Os filiados contribuem com a mensalidade associativa e, eventualmente, com algum complemento pelas despesas decorrentes das campanhas salariais e da negociação coletiva. Nos países que adotam a pluralidade, costuma haver, ainda, previsão da taxa de adesão, uma forma de contribuição negocial voluntária. Logo, os não filiados que quiserem ter direito às cláusulas coletivas deverão pagar referida taxa, sem necessidade de se associarem ao sindicato. A liberdade de filiação continua a ser assegurada.
Resta saber se, caso aprovadas tais mudanças, o Brasil continuará sem ratificar a Convenção nº 87, da OIT, considerada uma das convenções estruturantes das relações do trabalho.

*Gérson Marques, tutor do GRUPE, professor na UFC.